sábado, 19 de março de 2016

A mulher da minha vida


“Vai sair de casa com esse umbigo de fora?
“É”
“Porque?”
“Só tenho ele, se tivesse outro saía com  outro pra te agradar.”
“Debochada. Vai botar outra blusa, anda.”
“Iludido.”
“Iludido?”
“É, tem a ilusão que pode mandar em mim, coitado ”
Fiz cara feia, em vão. Ela nem me olhou enquanto saía com o umbigo de fora. “Mulherzinha atrevida...”, murmurei entre dentes, com medo de que ela ouvisse.  Se ela ouvisse, podia se magoar. Se ficasse magoada a noite eu não teria o corpo dela aninhado em meu peito. Não teria cheiro bom do seu  cabelo agradando meu olfato. Nem calor de pele macia pesando sobre meu corpo. O jeito era engolir a raiva e esperar pelo amor que viria depois.
Amélia tem o talento de me causar emoções intensas e avessas, sentia quase ódio para em seguida encher o peito de ternura. Bastava a lembrança dos olhos marrons de cílios compridos para transformar fúria em desejo.  Alquimia capaz de transmutar qualquer sentimento desfavorável em tesão ou afeto, coisas mais valiosas que ouro em pó. Se ela não fosse tão cheia de si, tão egoísta, tão sorridente, tão debochada, desbocada, desnuda... livre... seria a mulher perfeita. Já teria enfiado uma aliança no dedo dela.
Mas Amélia não estava interessada em aliança ou roupa que lhe tapasse o umbigo.  Amélia não se parecia com a 'mulher de verdade'.
Não sabia passar uma camisa, sua comida era  um desastre, qualquer cômodo que ocupasse por mais de uma hora ficaria bagunçado, era absolutamente impossível fazer com que ela estendesse sua toalha úmida depois do banho ao invés de deixá-la embolada no chão ou em cima da cama.
Amélia não era a mulher mais bonita do bairro, mas era a mulher da minha vida. Amigo leitor, você já saboreou o beijo 'da mulher da sua vida'? Se você acha que esta mulher tem apenas pernas torneadas, bunda arrebitada ou cintura de violão, esqueça, e passe a vida sem a mulher da sua vida.
A mulher da nossa vida não é apenas mais um rabo de saia. Seu olhar se distingue na multidão, seu hálito é o mais quente, seu sussurro é como uma tempestade que sem pedir licença, desrespeita as barreiras, invade nosso corpo e causa estremiços na corrente sanguínea, hemácias, veias e orifícios.
Amélia era agitada, elétrica, indomável. A ponta da minha língua em seu umbigo a deixava tal qual um vulcão que aos poucos vai se tornando indomável. Foi com esse e outros truques baixos que aprendi a sossegar sua fúria.
Por todas essas sensações eu estava preso a Amélia. Confesso, eu não tinha forças para me arrancar dos seus braços, dos seus abraços. Mão me pergunte 'o que ela tem'. Não tenho resposta, e no dia que eu responder eu a terei decifrado. Nesse dia eu a deixarei, pois o jogo terá chegado ao final.
Você consegue decifrar 'a mulher da sua vida'?
Se você estiver buscando neste texto uma resposta, lamento desapontá-lo, não tenho a receita. Mas tenho uma explicação, e ela só serve para mim porque Amélia é única... É a única mulher da minha vida.

Colaboração: João Rios Mendes

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